Analisando detidamente o tema, sobre o qual, não me envergonho de dizer, estou sempre aprendendo, pois não se aprende concordando docilmente com os argumentos de todos, mas ponderando-os e aquilatando-os, como bem ensinou Paulo Ferreira da Cunha in Princípios de Direito, ResJurídica, Porto, Portugal, 2006, p.387 ao afirmar que:
[…] os juristas estão na maior parte dos casos, na nossa civilização, que é a do Direito, a ser formados para obedecer, não para pensar ou decidir. E isso é uma das maiores revoluções silenciosas a que jamais assistimos: a docilização insensível dos porta-vozes e cavaleiros andantes da liberdade e da justiça, desde tempos remotíssimos. Os resultados só podem ser aterradores[…]. Por sorte, tenho trabalhado com pessoas compromissadas com a elevada função que exercem e que enchem de esperança em continuar em meu caminho, apesar dos tempos amargos em que a Magistratura vive, com o desrespeito de parte da sociedade e os ataques pontuais da mídia adredemente desinformada, e aqui, de novo, cito Paulo Ferreira da Cunha in Princípios de Direito, ResJurídica, Porto, Portugal, 2006, p.388 que dá esperanças ao afirmar:
[…] Há sempre, todavia, nestas épocas crepusculares, grandes esperanças e também figuras apaixonantes e heroicas de homens ponderados, reflexivos, verticais, entusiastas e batalhadores. É com o seu exemplo que contamos, e apenas ele nos permite confiar […].
Depois de longa reflexão noturna – em conluio com meu travesseiro – passei a entender que a melhor teoria sobre o tema proposto no título da postagem é a que dá realce primacial aos princípios da necessidade da incriminação e da lesividade do fato criminoso, ainda que nos delitos de mera conduta não implique em admitir sua existência independentemente de lesão efetiva ou potencial ao bem jurídico tutelado pela incriminação da hipótese de fato.
A moderna Teoria Geral do Direito Penal, sem acatar aqui a tese mais radical, – pois radicalismos não são frutos de estudos e meditação – que erige a exigência da ofensividade à limitação de raiz constitucional, de forma a proscrever a legitimidade da criação por lei de crimes de perigo abstrato ou presumido, porque basta aceitá-los como princípios gerais contemporâneos da interpretação da lei penal, que hão de prevalecer sempre que a regra incriminadora os comporte.
No delito de porte de arma sem autorização legal ou regulamentar, os princípios bastam, de logo, para elidir a incriminação do porte da arma de fogo inidônea para a produção de disparos. Aqui, falta à incriminação da conduta o objeto material do tipo. Não importa que a arma verdadeira, mas incapaz de disparar, ou a arma de brinquedo possam servir de instrumento de intimidação para a prática de outros crimes, particularmente os comissíveis com utilização de ameaça – pois é certo que, como tal, também se podem utilizar outros objetos – da faca à pedra e do porrete ao caco de vidro -, cujos portes não constituem crimes autônomos e cujas utilizações não não compõem o elemento de causa especial de aumento de pena.
No porte de arma de fogo desmuniciada, é preciso distinguir duas situações, à luz do princípio de disponibilidade: (1) se o agente traz consigo a arma desmuniciada, mas tem a munição adequada à mão, de modo a viabilizar sem demora significativa o municiamento e, em consequência, o eventual disparo, tem-se arma disponível e o fato realiza o tipo penal; (2) ao contrário, se a munição não existe ou está em lugar inacessível de imediato, não há a imprescindível disponibilidade da arma de fogo, como tal – isto é, como artefato idôneo a produzir disparo – e, por isso, não se realiza a figura típica.
A própria etimologia da palavra arma de fogo reporta a noção de algo que utiliza a força da queima de uma substância explosiva para o disparo capaz de produzir o fogo necessário e que decorre de um acionamento mecânico do gatilho, por impacto do percursor na espoleta do cartucho de pólvora, de forma que o gás produzido em elevada velocidade possa fazer expelir a cápsula de metal ceifadora de vidas e de esperanças. Por mais que a violência urbana e a falta de capacidade de nossas leis e legisladores enxergarem o óbvio, que é a frouxidão de nosso sistema de cumprimento de penas, não podemos inventar meios de incriminação destoados da realidade, sob pena de jogarmos no esgoto todo o nosso milenar esforço civilizatório.
É o que penso, com respeito às opiniões contrarias. Até a próxima!
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